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quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Postamos abaixo o texto de Luiz Eduardo Soares, antropólogo, ex-secretário nacional de segurança(2003), co-autor de tropa de elite.


QUINTA-FEIRA, 25 DE NOVEMBRO DE 2010

A crise no Rio e o pastiche midiático

Sempre mantive com jornalistas uma relação de respeito e cooperação. Em alguns casos, o contato profissional evoluiu para amizade. Quando as divergências são muitas e profundas, procuro compreender e buscar bases de um consenso mínimo, para que o diálogo não se inviabilize. Faço-o por ética –supondo que ninguém seja dono da verdade, muito menos eu--, na esperança de que o mesmo procedimento seja adotado pelo interlocutor. Além disso, me esforço por atender aos que me procuram,porque sei que atuam sob pressão, exaustivamente, premidos pelo tempo e por pautas urgentes. A pressa se intensifica nas crises, por motivos óbvios. Costumo dizer que só nós, da segurança pública (em meu caso,quando ocupava posições na área da gestão pública da segurança), os médicos e o pessoal da Defesa Civil, trabalhamos tanto –ou sob tanta pressão-- quanto os jornalistas.
Digo isso para explicar por que, na crise atual, tenho recusado convites para falar e colaborar com a mídia:
(1) Recebi muitos telefonemas, recados e mensagens. As chamadas são contínuas, a tal ponto que não me restou alternativa a desligar o celular. Ao todo, nesses dias, foram mais de cem pedidos de entrevistas ou declarações. Nem que eu contasse com uma equipe de secretários, teria como responder a todos e muito menos como atendê-los. Por isso, aproveito a oportunidade para desculpar-me. Creiam, não se trata de descortesia ou desapreço pelos repórteres,produtores ou entrevistadores que me procuraram.
(2) Além disso, não tenho informações de bastidor que mereçam divulgação. Por outro lado, não faria sentido jogar pelo ralo a credibilidade que construí ao longo da vida. E isso poderia acontecer se eu aceitasse aparecer na TV, no rádio ou nos jornais, glosando os discursos oficiais que estão sendo difundidos, declamando platitudes,reproduzindo o senso comum pleno de preconceitos, ou divagando em torno de especulações. A situação é muito grave e não admite leviandades. Portanto, só faria sentido falar se fosse para contribuir de modo eficaz para o entendimento mais amplo e profundo da realidade que vivemos. Como fazê-lo em alguns parcos minutos, entrecortados por intervenções de locutores e debatedores? Como fazê-lo no contexto em que todo pensamento analítico é editado, truncado, espremido –em uma palavra, banido--, para que reinem, incontrastáveis, a exaltação passional das emergências, as imagens espetaculares, os dramas individuais e a retórica paradoxalmente triunfalista do discurso oficial?
(3) Por fim, não posso mais compactuar com o ciclo sempre repetido na mídia: atenção à segurança nas crises agudas e nenhum investimento reflexivo e informativo realmente denso e consistente, na entressafra, isto é, nos intervalos entre as crises. Na crise, as perguntas recorrentes são: (a) O que fazer, já, imediatamente, para sustar a explosão de violência? (b) O que a polícia deveria fazer para vencer, definitivamente, o tráfico de drogas? (c) Por que o governo não chama o Exército? (d) A imagem internacional do Rio foi maculada? (e)Conseguiremos realizar com êxito a Copa e as Olimpíadas?
Ao longo dos últimos 25 anos, pelo menos, me tornei “as aspas” que ajudaram a legitimar inúmeras reportagens. No tópico, “especialistas”, lá estava eu, tentando, com alguns colegas, furar o bloqueio à afirmação de uma perspectiva um pouquinho menos trivial e imediatista. Muitas dessas reportagens, por sua excelente qualidade, prescindiriam de minhas aspas –nesses casos, reduzi-me a recurso ocioso, mera formalidade das regras jornalísticas. Outras, nem com todas as aspas do mundo se sustentariam. Pois bem, acho que já fui ou proporcionei aspas o suficiente. Esse código jornalístico, com as exceções de praxe, não funciona, quando o tema tratado é complexo, pouco conhecido e, por sua natureza, rebelde ao modelo de explicação corrente. Modelo que não nasceu na mídia, mas que orienta as visões aí predominantes.
Particularmente, não gostaria de continuar a ser cúmplice involuntário de sua contínua reprodução. Eis por que as perguntas mencionadas são expressivas do pobre modelo explicativo corrente e por que devem ser consideradas obstáculos ao conhecimento e réplicas de hábitos mentais refratários às mudanças inadiáveis. Respondo sem a elegância que a presença de um entrevistador exigiria. Serei, por assim dizer, curto e grosso,aproveitando-me do expediente discursivo aqui adotado, em que sou eu mesmo o formulador das questões a desconstruir. Eis as respostas, na
sequência das perguntas, que repito para facilitar a leitura:
(a) O que fazer, já, imediatamente, para sustar a violência e resolver o desafio da insegurança? Nada que se possa fazer já, imediatamente, resolverá a insegurança. Quando se está na crise, usam-se os instrumentos disponíveis e os procedimentos conhecidos para conter os sintomas e salvar o paciente. Se desejamos, de fato, resolver algum problema grave, não é possível continuar a tratar o paciente apenas quando ele já está na UTI, tomado por uma enfermidade letal, apresentando um quadro agudo. Nessa hora, parte-se para medidas extremas, de desespero, mobilizando-se o canivete e o açougueiro, sem anestesia e assepsia. Nessa hora, o cardiologista abre o tórax do moribundo na maca, no corredor. Não há
como construir um novo hospital, decente, eficiente, nem para formar especialistas, nem para prevenir epidemias, nem para adotar procedimentos que evitem o agravamento da patologia.  Por isso, o primeiro passo para evitar que a situação se repita é trocar a pergunta. 
O foco capaz de ajudar a mudar a realidade é aquele apontado por outra pergunta: o que fazer para aperfeiçoar a segurança pública, no Rio e no Brasil, evitando a violência de todos os dias, assim como sua intensificação, expressa nas sucessivas crises? Se o entrevistador imaginário interpelar o respondente, afirmando que a sociedade exige uma resposta imediata, precisa de uma ação emergencial e não aceita nenhuma abordagem que não produza efeitos práticos imediatos, a melhor resposta seria: caro amigo, sua atitude representa, exatamente, a postura que tem impedido avanços consistentes na segurança pública. Se a sociedade, a mídia e os governos continuarem se recusando a pensar e abordar o problema em profundidade e extensão, como um fenômeno multidimensional a requerer enfrentamento sistêmico, ou seja, se prosseguirmos nos recusando,enquanto Nação, a tratar do problema na perspectiva do médio e do longo prazos, nos condenaremos às crises, cada vez mais dramáticas, para as quais não há soluções mágicas.
A melhor resposta à emergência é começar a se movimentar na direção da reconstrução das condições geradoras da situação emergencial. Quanto ao imediato, não há espaço para nada senão o disponível, acessível,conhecido, que se aplica com maior ou menor destreza, reduzindo-se danos e prolongando-se a vida em risco.
A pergunta é obtusa e obscurantista, cúmplice da ignorância e da apatia.
(b) O que as polícias fluminenses deveriam fazer para vencer, definitivamente, o tráfico de drogas? Em primeiro lugar, deveriam parar de traficar e de associar-se aos traficantes, nos “arregos” celebrados por suas bandas podres, à luz do dia, diante de todos. Deveriam parar de negociar armas com traficantes, o que as bandas podres fazem, sistematicamente. Deveriam também parar de reproduzir o pior do tráfico, dominando, sob a forma de máfias ou milícias, territórios e populações pela força das armas, visando rendimentos criminosos obtidos por meios cruéis.
Ou seja, a polaridade referida na pergunta (polícias versus tráfico)esconde o verdadeiro problema: não existe a polaridade. Construí-la -isto é, separar bandido e polícia; distinguir crime e polícia-- teria de ser a meta mais importante e urgente de qualquer política de segurança digna desse nome. Não há nenhuma modalidade importante de ação criminal no Rio de que segmentos policiais corruptos estejam ausentes. E só por isso que ainda existe tráfico armado, assim como as milícias.
Não digo isso para ofender os policiais ou as instituições. Não generalizo. Pelo contrário, sei que há dezenas de milhares de policiais honrados e honestos, que arriscam, estóica e heroicamente, suas vidas por salários indignos. Considero-os as primeiras vítimas da degradação institucional em curso, porque os envergonha, os humilha,os ameaça e acua o convívio inevitável com milhares de colegas corrompidos, envolvidos na criminalidade, sócios ou mesmo empreendedores do crime.
Não nos iludamos: o tráfico, no modelo que se firmou no Rio, é uma realidade em franco declínio e tende a se eclipsar, derrotado por sua irracionalidade econômica e sua incompatibilidade com as dinâmicas políticas e sociais predominantes, em nosso horizonte histórico.
Incapaz, inclusive, de competir com as milícias, cuja competência está na disposição de não se prender, exclusivamente, a um único nicho de mercado, comercializando apenas drogas –mas as incluindo em sua carteira de negócios, quando conveniente. O modelo do tráfico armado, sustentado em domínio territorial, é atrasado, pesado, anti-econômico:
custa muito caro manter um exército, recrutar neófitos, armá-los (nada disso é necessário às milícias, posto que seus membros são policiais),mantê-los unidos e disciplinados, enfrentando revezes de todo tipo e ataques por todos os lados, vendo-se forçados a dividir ganhos com a banda podre da polícia (que atua nas milícias) e, eventualmente, com os líderes e aliados da facção. É excessivamente custoso impor-se sobre um território e uma população, sobretudo na medida que os jovens mais vulneráveis ao recrutamento comecem a vislumbrar e encontrar alternativas. Não só o velho modelo é caro, como pode ser substituído com vantagens por outro muito mais rentável e menos arriscado, adotado nos países democráticos mais avançados: a venda por delivery ou em dinâmica varejista nômade, clandestina, discreta, desarmada e pacífica. Em outras palavras, é melhor, mais fácil e lucrativo praticar o negócio das drogas ilícitas como se fosse contrabando ou pirataria do que fazer a guerra. Convenhamos, também é muito menos danoso para a sociedade, por óbvio.
(c) O Exército deveria participar? Fazendo o trabalho policial, não, pois não existe para isso, não é treinado para isso, nem está equipado para isso. Mas deve, sim, participar. A começar cumprindo sua função de controlar os fluxos das armas no país. Isso resolveria o maior dos problemas: as armas ilegais passando, tranquilamente, de mão em mão, com as benções, a mediação e o estímulo da banda podre das polícias.
E não só o Exército. Também a Marinha, formando uma Guarda Costeira com foco no controle de armas transportadas como cargas clandestinas ou despejadas na baía e nos portos. Assim como a Aeronáutica, identificando e destruindo pistas de pouso clandestinas, controlando o espaço aéreo e apoiando a PF na fiscalização das cargas nos aeroportos.
(d) A imagem internacional do Rio foi maculada? Claro. Mais uma vez.(e) Conseguiremos realizar com êxito a Copa e as Olimpíadas? Sem dúvida. Somos ótimos em eventos. Nesses momentos, aparece dinheiro, surge o “espírito cooperativo”, ações racionais e planejadas impõem-se. Nosso calcanhar de Aquiles é a rotina. Copa e Olimpíadas serão um sucesso. O problema é o dia a dia.
Palavras Finais Traficantes se rebelam e a cidade vai à lona. Encena-se um drama sangrento, mas ultrapassado. O canto de cisne do tráfico era esperado.Haverá outros momentos análogos, no futuro, mas a tendência declinante é inarredável. E não porque existem as UPPs, mas porque correspondem a um modelo insustentável, economicamente, assim como social e politicamente. As UPPs, vale dizer mais uma vez, são um ótimo programa, que reedita com mais apoio político e fôlego administrativo o programa “Mutirões pela Paz”, que implantei com uma equipe em 1999, e que acabou soterrado pela política com “p” minúsculo, quando fui exonerado, em 2000, ainda que tenha sido ressuscitado, graças à liderança e à competência raras do ten.cel. Carballo Blanco, com o título GPAE, como reação à derrocada que se seguiu à minha saída do governo. A despeito de suas virtudes, valorizadas pela presença de Ricardo Henriques na secretaria estadual de assistência social --um dos melhores gestores do país--, elas não terão futuro se as polícias não forem profundamente transformadas. Afinal, para tornarem-se política pública terão de incluir duas qualidades indispensáveis:escala e sustentatibilidade, ou seja, terão de ser assumidas, na esfera da segurança, pela PM. Contudo, entregar as UPPs à condução da PM seria condená-las à liquidação, dada a degradação institucional já referida.
O tráfico que ora perde poder e capacidade de reprodução só se impôs, no Rio, no modelo territorializado e sedentário em que se estabeleceu, porque sempre contou com a sociedade da polícia, vale reiterar. Quando o tráfico de drogas no modelo territorializado atinge seu ponto histórico de inflexão e começa, gradualmente, a bater em retirada, seus sócios –as bandas podres das polícias-- prosseguem fortes,
firmes, empreendedores, politicamente ambiciosos, economicamente vorazes, prontos a fixar as bandeiras milicianas de sua hegemonia.
Discutindo a crise, a mídia reproduz o mito da polaridade polícia versus tráfico, perdendo o foco, ignorando o decisivo: como, quem, em que termos e por que meios se fará a reforma radical das polícias, no Rio, para que estas deixem de ser incubadoras de milícias, máfias, tráfico de armas e drogas, crime violento, brutalidade, corrupção?Como se refundarão as instituições policiais para que os bons profissionais sejam, afinal, valorizados e qualificados? Como serão transformadas as polícias, para que deixem de ser reativas, ingovernáveis, ineficientes na prevenção e na investigação? As polícias são instituições absolutamente fundamentais para o Estado democrático de direito. Cumpre-lhes garantir, na prática, os direitos e as liberdades estipulados na Constituição. Sobretudo, cumpre-lhes proteger a vida e a estabilidade das expectativas positivas
relativamente à sociabilidade cooperativa e à vigência da legalidade e da justiça. A despeito de sua importância, essas instituições não foram alcançadas em profundidade pelo processo de transição democrática, nem se modernizaram, adaptando-se às exigências da complexa sociedade brasileira contemporânea. O modelo policial foi herdado da ditadura. Ele servia à defesa do Estado autoritário e era funcional ao contexto marcado pelo arbítrio. Não serve à defesa da cidadania. A estrutura organizacional de ambas as polícias impede a gestão racional e a integração, tornando o controle impraticável e a avaliação, seguida por um monitoramento corretivo, inviável. Ineptas para identificar erros, as polícias condenam-se a repeti-los. Elas são rígidas onde teriam de ser plásticas, flexíveis e descentralizadas; e são frouxas e anárquicas, onde deveriam ser rigorosas. Cada uma delas, a PM e a Polícia Civil, são duas instituições: oficiais e não-oficiais; delegados e não-delegados.
E nesse quadro, a PEC-300 é varrida do mapa no Congresso pelos governadores, que pagam aos policiais salários insuficientes, empurrando-os ao segundo emprego na segurança privada informal e ilegal. Uma das fontes da degradação institucional das polícias é o que denomino "gato orçamentário", esse casamento perverso entre o Estado e a ilegalidade: para evitar o colapso do orçamento público na área de segurança, as autoridades toleram o bico dos policiais em segurança privada. Ao fazê-lo, deixam de fiscalizar dinâmicas benignas (em termos, pois sempre há graves problemas daí decorrentes), nas quais policiais honestos apenas buscam sobreviver dignamente, apesar da ilegalidade de seu segundo emprego, mas também dinâmicas malignas: aquelas em que policiais corruptos provocam a insegurança para vender segurança; unem-se como pistoleiros a soldo em grupos de extermínio; e, no limite, organizam-se como máfias ou milícias, dominando pelo terror populações e territórios. Ou se resolve esse gargalo (pagando o suficiente e fiscalizando a segurança privada /banindo a informal e ilegal; ou legalizando e disciplinando, e fiscalizando o bico), ou não faz sentido buscar aprimorar as polícias.
O Jornal Nacional, nesta quinta, 25 de novembro, definiu o caos no Rio de Janeiro, salpicado de cenas de guerra e morte, pânico e desespero, como um dia histórico de vitória: o dia em que as polícias ocuparam a Vila Cruzeiro. Ou eu sofri um súbito apagão mental e me tornei um idiota contumaz e incorrigível ou os editores do JN sentiram-se autorizados a tratar milhões de telespectadores como contumazes e incorrigíveis idiotas. Ou se começa a falar sério e levar a sério a tragédia da insegurança pública no Brasil, ou será pelo menos mais digno furtar-se a fazer coro à farsa.
Postado por Luiz Eduardo Soares às 21:08



sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Vídeo sobre Tabagismo

Um projeto da UFRJ do Núcleo de Divulgação do Programa de Oncobiologia lançou recentemente um vídeo animação para tratar do assédio da indústria tabagista aos adolescentes. O filme se chama "Jogo de uma morte anunciada."  Com apoio da CNPq, FAPERJ e da Fundação do câncer.
Vale apena conferir!!


terça-feira, 21 de setembro de 2010

Senad e CNJ lançam mais um projeto do Plano Integrado de Enfrentamento ao Crack (01/09/2010)

A Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (Senad), vinculada ao Gabinete de Segurança Institucional (GSI), da Presidência da República e o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) lançam dia 1º de setembro, quarta-feira, o Projeto de Integração de Competências no Desempenho da Atividade Judiciária com Usuários e Dependentes de Drogas. O lançamento ocorre por meio de uma videoconferência transmitida pela Internet aos presidentes dos Tribunais de Justiça e das Corregedorias dos Estados e do Distrito Federal.
Participarão da videoconferência os ministros Jorge Armando Felix, Ministro Chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República; Gilson Dipp, Corregedor Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça, Luiz Paulo Barreto, Ministro da Justiça; bem como os coordenadores do projeto, Dra. Paulina do Carmo Arruda Vieira Duarte, Secretária-Adjunta da Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas e Dr. Prof. Arthur Guerra de Andrade, da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP).
O objetivo do lançamento é divulgar o projeto que foi criado para atender ao Decreto nº 7.179/10 que instituiu o Plano Integrado de Enfrentamento ao Crack e outras Drogas, e aos Provimentos nº4 e nº9, do CNJ, que definem medidas com vistas à eficácia e ao bom desempenho da atividade judiciária na implantação das atividades de atenção, proteção e reinserção social de usuários e dependentes encaminhados aos Juizados Especiais Criminais, bem como as crianças e adolescentes encaminhadas às Varas da Infância e Juventude.
O Projeto
O Projeto de Integração de Competências no Desempenho da Atividade Judiciária com Usuários e Dependentes de Drogas será desenvolvido em quatro etapas. Na primeira, será promovido o Curso de Extensão Universitária: Integração de Competências no Desempenho da Atividade Judiciária com Usuários e Dependentes de Drogas.
Na primeira edição, serão ofertadas 15.000 vagas gratuitas em todo o Brasil, para juízes, servidores e colaboradores do Poder Judiciário, que atuam nos Juizados Especiais Criminais e nas Varas da Infância e Juventude.
O curso tem por objetivo promover a capacitação dos diferentes atores envolvidos na aplicação da lei, visando ao cumprimento de penas e medidas alternativas, medidas protetivas e medidas sócio educativas, de modo a garantir o aprimoramento do serviço judiciário e diminuição da reincidência.
As vagas serão ofertadas gratuitamente, na modalidade de Ensino a Distância (EaD), com carga horária total de 120 horas, duração de três meses e certificado de extensão universitária expedido pela Universidade de São Paulo (USP).
O curso oferecerá ambientes interativos com a disponibilização de chats, fóruns, teleconferências, videoaulas, dentre outros.
Na USP, uma equipe de tutores capacitados, estará à disposição dos cursistas para auxiliá-los e acompanhá-los no estudo dos conteúdos. O acompanhamento será realizado por e-mail, fax ou via telefonia gratuita na modalidade 0800, que estará disponível de segunda a sexta-feira, das 08:00 às 22:00, ininterruptamente.
Na segunda etapa, o projeto prevê a realização do Levantamento Nacional das Possibilidades e Dificuldades na Aplicação da Lei sobre Drogas entre os Operadores do Direito dos Juizados Especiais Criminais (JEC), com o obejtivo de avaliar possíveis dificuldades na aplicação da Lei nº. 11.343/06, considerando a percepção do juiz em relação ao usuário e em relação  a disponibilidade técnica de sua equipe, a percepção do Ministério Público quanto a aplicabilidade das medidas socioeducativas e a opinião dos usuários sentenciados em relação às novas medidas da Lei.
A terceira etapa prevê a realização de Seminários Regionais de Boas Práticas, objetivando a troca de experiências entre os Operadores de Direito e a equipe multidisciplinar dos Juizados Especiais Criminais quanto à aplicabilidade das penas alternativas e medidas socioeducativas. Serão cinco seminários, um em cada região, nas cidades de Curitiba (Sul), Rio de Janeiro (Sudeste), Brasília (Centro-Oeste), Porto Velho (Norte) e Maceió (Nordeste).
Em uma última etapa, o projeto contará com o desenvolvimento de metodologia específica de aplicação das penas e medidas alternativas, medidas protetivas e socioeducativas.

Parcerias
Para a realização desse projeto, a SENAD celebrou parceria com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o Fórum Nacional de Juizados Especiais (FONAJE), a Escola Nacional da Magistratura (ENM), o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (PRONASCI), do Ministério da Justiça, a Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) e a Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP).
Assista à videoconferência aqui:http://www.youtube.com/watch?v=g0HkjuT4j6w
Inscrições para o Curso :

sábado, 11 de setembro de 2010

SECRETÁRIO ANUNCIA ABERTURA DE NOVOS LEITOS EM HOSPITAIS PÚBLICOS PARA TRATAR USUÁRIOS DE CRACK


RIO - O secretário nacional Antidrogas, general Paulo Roberto Uchôa, anunciou nesta quinta-feira que o governo federal vai lançar, na próxima semana, os primeiros editais para a instalação de leitos em hospitais com o objetivo de tratar usuários de entorpecentes, principalmente de crack. O anúncio foi feito na 2ª Conferência Latino-Americana sobre Políticas de Drogas, na Faculdade Nacional de Direito, no Rio.
- Se não houver conselhos, não haverá objetivos, e vamos continuar apagando incêndios - disse o secretário.Os editais serão as primeiras medidas práticas do Plano Nacional de Combate ao Crack, lançado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em maio, e que terá repasse de R$ 410 milhões para os municípios. Uchôa fez um apelo para que os governos municipais e estaduais incrementem os conselhos regionais de políticas de drogas.
Em um dos painéis, Manuel Cardoso, integrante do Conselho Diretivo do Instituto de Droga e Toxicomanias de Portugal, elogiou a iniciativa de descriminalizar o usuário naquele país. Cardoso disse que a medida, adotada na década passada, estabeleceu uma distinção clara entre usuário e traficante: a posse da quantidade de droga equivalente ao consumo de dez dias.
- É uma experiência muito positiva porque, até o momento da descriminalização, colocava-se em situação de fragilidade quer o tóxico-dependente, quer o terapeuta. O terapeuta porque lidava com um criminoso, e o toxico-dependente porque tinha sempre medo, pois podia ser delatado e preso - disse Cardoso, antes de Uchôa afirmar que era contra uma medida similar no Brasil.

domingo, 29 de agosto de 2010

II Conferência Latino Americana e I Conferência Brasileira Sobre Políticas de Drogas

Nos dias 26 e 27 de agosto, ocorreu no Rio de Janeiro a II Conferência Latino Americana e I Conferência Brasileira Sobre Políticas de Drogas, organizadas por duas ONGs a Intercambios e a Psicotropicus. O objetivo segundo os organizadores foi promover o debate social baseado em políticas não-punitivas e promover o intercâmbio na região latino americana entre acadêmico e sociedade civil e formadores de opinião.
Com participação de vários intelectuais e pensadores da questão das drogas o evento contou com os seguintes painéis:

Painel - Direitos Humanos e Políticas de Drogas
Em países de todo o mundo, as pessoas que usam drogas ilegais frequentemente enfrentam situações de discriminação, rejeição e violência que levam a violações de seus direitos. Muitos destes incidentes estão escondidos ou são justificados por argumentos como a “periculosidade” ou “incapacidade” dos usuários de drogas, culpando-os assim dos abusos a que estão sujeitos. De que maneira a atual política de droga está relacionado com as violações dos direitos humanos? Quais são as medidas tomadas pelos governos para garantir o respeito aos direitos das pessoas que usam drogas? Que ações podem ser tomadas para promover a defesa dos direitos?
Painel - Os usuários de drogas na agenda das agências multilaterais
As agências multilaterais constituem um ator fundamental no desenvolvimento de políticas na região, contribuindo para a construção da agenda pública por meio de programas de assistência técnica e financeira. Tanto a Assembléia Geral das Nações Unidas como várias agências do sistema têm produzido uma série de resoluções, declarações e documentos orientadores á atenção aos usuários de drogas no contexto da saúde pública e do respeito pelos direitos humanos. No entanto, suas ações não são suficientes nem sistemáticas na América Latina. Em que grau de prioridade está os usuários de drogas na agenda das agências multilaterais na região? Como se poderia incrementar a atenção a essas populações?
Painel - Políticas Sociais e Sanitárias
Um foco importante do debate atual sobre a reforma das políticas de drogas baseia-se no direito à saúde como uma questão inseparável do respeito aos direitos humanos fundamentais. O progresso observado na região em relação à perseguição dos usuários de drogas requer um papel protagonista para as políticas sociais e de saúde. Como traduzir os discursos inovadores e respeitosos dos direitos humanos nas políticas eficazes em matéria de droga? Quais são os principais obstáculos e desafios na América Latina para avançar na implementação de políticas sociais e de saúde que atendam às necessidades das populações de usuários de drogas e as comunidades em que estão inseridas?
Painel - Determinantes estruturais dos problemas relacionados com as drogas
A complexidade do fenômeno da droga e suas múltiplas facetas incluem aspectos como produção e tráfico de drogas, o papel das forças armadas, corrupção política, entre outras. Também é necessário enquadrá-lo em um grande cenário que contemple aspectos estruturais das sociedades latino-americana, caracterizado pela pobreza e a desigualdade, e que inclua a interação com as políticas sociais e econômicas realizadas na região. A análise das forças estruturais e contextos culturais são essenciais para entender a particular vulnerabilidade dos usuários de drogas. De que maneira esses processos históricos na economia e na sociedade têm contribuído para a vulnerabilidade? Qual o papel desempenhado pela política externa dos Estados Unidos para a América Latina?
Painel - Atenção integral aos usuários de drogas
A atenção integral aos usuários de drogas implica no desenvolvimento de estratégias complementarias e multi-setoriais que se ocupam da prevenção, a assistência pelo consumo problemático, a redução dos danos e a inclusão social. Como se enfrentam estes desafios na região? Que propostas existem para melhorar o acesso e a qualidade dos serviços? Que obstáculos identificam as populações mais afetadas?
Painel - Conseqüências da guerra contra as drogas
O paradigma da guerra contra as drogas tem trazido uma série de conseqüências que agravaram os problemas na região: prisões abarrotadas, lavagem de dinheiro, aumento da pobreza e insegurança das populações camponesas pela erradicação forçada dos cultivos, problemas ambientais e de saúde devido a fumigações aéreas, entre outros. Qual é a extensão e dimensão destes problemas? Como enfrentá-los?
Painel - Reformas legislativas na América Latina
Em vários países da região estão sendo discutidas reformas legislativas em matéria de drogas. Entre outros aspectos, são incluídos temas como a proporcionalidade nas sentenças e na aplicação de estândares de direitos humanos na legislação e na prática judicial. Qual é o estado atual desses debates? Que fundamentos orientam estas iniciativas? 
Para discutir tais temas foram convidados os seguintes palestrantes:


Mais informações visite o site da conferência: http://conferenciadrogas.com/
Jonatas.

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

CONSELHO MUNICIPAL DE POLITICAS SOBRE DROGAS EM DE CABO FRIO E UNIVERSIDADE VEIGA DE ALMEIDA REALIZAM SIMPÓSIO NO PRÓXIMO DIA 24 DE AGOSTO.

O COMAD Cabo Frio (Conselho Municipal de Políticas Públicas Sobre Drogas) juntamente com a Universidade Veiga de Almeida em parceria com a Unimed, Câmara dos Vereadores e Prefeitura de Cabo Frio, realizarão no próximo dia 24 de agosto o simpósio: Percepções Multidisciplinares Sobre Drogas.
A intenção do evento é ampliar o debate sobre drogas no município, neste primeiro encontro serão apresentadas duas percepções, uma da psiquiatria a partir da relação sujeito/droga numa perspectiva histórico/cultural e uma percepção antropológica da relação sociedade e drogas.
O evento está programado para às 19 horas e acontecerá no auditório principal do Campus da Universidade na estrada Perynas s/n.
Confira mais detalhes no cartaz:
Dúvidas ligue para: 22 8826 6520 – 9974 7874 -  

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

COMAD elabora projeto de lei de reestruturação

Um ano após seu restabelecimento o COMAD - Cabo Frio encaminha para apreciação do prefeito o projeto de lei que tem por objetivo a reestruturação do mesmo, o novo projeto deve revogar a lei municipal nº 1.526 de 22 de novembro de 2000. O projeto fora encaminhado no início do ano para a Procuradoria do Município e agora seguirá para o executivo que deverá encaminhá-lo para a Câmara. 
O projeto de reestruturação do COMAD Cabo Frio tem por objetivo adequar a estrutura municipal a lei federal 11.343 de 23 de agosto de 2006. Dentre as principais mudanças propostas no projeto estão o aumento de 9 para 12 membros, já que  o mesmo deve ser paritário e a criação do FUMPAD - Fundo Municipal de Políticas sobre Drogas. Além disso o COMAD será integrado ao SISNAD - Sistema Nacional de Políticas Públicas Sobre Drogas o que  possibilitará  a captação de recursos federais para projetos de prevenção e tratamento no município de Cabo Frio. 
O COMAD - Cabo Frio aprovou também seu Regimento Interno e deverá realizar sua primeira Conferência Municipal até novembro deste ano. 
Para quem quiser ver o projeto de reestruturação na integra acesse o link abaixo:
https://docs.google.com/leaf?id=18XMkqUBNmLGp86stjdKWy7mxJuaN-IglPOOCSKSfyqfvn3gp8zEE2PzMm3lo&sort=name&layout=list&num=50


Jonatas Carvalho

    

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Políticas públicas sobre drogas: descriminalizar ou despenalizar, que diferença faz?

Pensamos demasiadamente
Sentimos muito pouco
Necessitamos mais de humildade
Que de máquinas.
Mais de bondade e ternura
Que de inteligência.
Sem isso,
A vida se tornará violenta e
Tudo se perderá.


              A lei em vigor sobre drogas no Brasil é a 11.346/2006, produzida no governo Lula, dentre as alterações significativas que a diferencia das duas anteriores (a 6.386/1976 e a lei 10.409/2002, criada no fim do governo de FHC), estão os artigos do capítulo III, do título III, que trata das atividades de prevenção do uso indevido atenção e reinserção social dos usuários e dependentes de drogas. O referente capítulo inicia-se com a descrição das possíveis penas a serem aplicadas a quem “adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar...” (art. 27). O artigo 28 prevê várias “penas” para o “consumidor de substâncias ilegais” flagrado nas situações já citadas no artigo 27, que seriam: I - advertência sobre os efeitos das drogas; II - prestação de serviços à comunidade; III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo, além de multas.

              A lei 6.386/1976 que se manteve em vigor por 22 longos anos, até a criação da lei 10.409/2002 no governo de FHC, previa em seu artigo 12º, pena de 3 a 15 anos de reclusão para quem:
          Importar ou exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda ou oferecer, fornecer ainda que gratuitamente, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar ou entregar, de qualquer forma, a consumo substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar; (Art. 12, Cap. III).

            Embora a lei 11.346/2006 tenha acompanhado a vertente estadunidense de uma política rígida, os legisladores conseguiram certo avanço em relação a lei anterior quanto ao tema da aplicação das penas aos usuários e dependentes de drogas ilícitas. A lei 10.409/2002 teve uma grande quantidade de veto por parte do ministério da justiça, o governo FHC vetou quase 70% (dos 59 artigos presentes no texto original 35 foram vetados) do projeto aprovado na câmara. O texto teve, por exemplo, todo o capítulo III vetado, sob a alegação de que tal capítulo:

 ...resulta na incapacidade de o sistema legal proposto substituir plenamente a Lei no 6.368, de 21 de outubro de 1976, que "Dispõe sobre medidas de prevenção e repressão ao tráfico ilícito e uso indevido de substâncias entorpecentes ou que determinem dependência física ou psíquica, e dá outras providências. (Diário Oficial da União - Seção 1 - 14/01/2002 , Página 6 - Veto)

            Desta forma a lei 10.409/2002 da era FHC não trouxe quaisquer alterações no que diz respeito a questão da criminalização e penalização do uso e porte para consumo pessoal de drogas. Apesar de como muito bem salientou MAIEROVITCH (2004), a partir de 1984 com as mudanças no código penal, foi possível que os juízes substituíssem a pena de prisão contemplada na lei, por multas. Além do mais o surgimento dos juizados criminais especiais federais, contribuíram para a não imposição da prisão.[1]

            Neste sentido, o mérito da lei 11.346/2006 é exatamente alterar o texto de 1976, tarefa que o governo de FHC recusou a fazê-la. A nova lei “antidrogas”, como ficou conhecida na época, revogou tanto a lei de 6.386/1976, quanto a lei de 10.409/2002. Para alguns foi um avanço significativo, o novo texto daria mais poder as políticas de redução de danos e a justiça terapêutica. Usuários e dependentes não irão mais dividir uma cela com vários tipos de criminosos, mas sofrerão penas que incluem a prestação de serviços comunitários e tratamento compulsório.

            Não há, no entanto, consenso no que tange a positividade e avanço da lei 11.346/2006, para alguns especialistas a lei “antidrogas” do governo Lula, manteve a criminalização do uso e do porte para consumo pessoal. Isto porque tanto o porte quanto o uso continuam sendo crimes, apenas o usuário e dependente não mais serão punidos com reclusão. Logo a mudança, diferente de países como Portugal, onde o uso e o porte foram descriminalizados, sendo o portador ou usuário um infrator e não um criminoso, no caso brasileiro, o que ocorreu foi uma despenalização e não uma descriminalização.  
           
            A mudança da lei, todavia, não está assegurada como definitiva, visto que tramita no senado federal desde 2009 o projeto de lei nº 227 de autoria do Senador Gerson Camata, cujo objetivo é alterar o art. 28 da lei 11.343/2006. Sob a alegação de que o referido artigo reside um equivoco legal, o projeto justifica-se por procurar corrigir tal equivoco já que na opinião do autor:

(...) o que houve foi, sim, uma descriminalização formal e, ao mesmo tempo, uma despenalização. Primeiro, acabou-se com o caráter criminoso do fato e, em seguida, evitou-se a pena de prisão para o usuário de drogas. (PLS – Projeto de Lei do Senado Nº 227 de 2009).  

            No projeto do Senador Gerson Camata a alteração proposta seria incluir no texto do art.28 da lei em questão, pena de detenção de 6 meses a 1 ano, para as situações previstas e  descritas no art.28 podendo o juiz substituir a pena restritiva dos direitos por prestação de serviços.  O Senador Camata utiliza como argumento para endurecer a lei contra usuários e dependentes uma sucessão de pesquisas realizadas por órgãos oficiais dos EUA, Canadá e os relatórios do UNODC (Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crimes), tais pesquisas considerariam, na visão do político que o usuário é “o ponto nevrálgico de toda engenharia social que leva do tráfico a queda da riqueza do país.”

            A posição que procura colocar o usuário como mantenedor do sistema do tráfico ilegal é compartilhado entre alguns, um exemplo é o publicitário João Blota, autor do livro “Noia” e que apesar de ter sido usuário de drogas, sustenta a posição de que o usuário deve ser o “foco do sistema de repressão.” Há, no entanto, posições semelhantes, isto é, que entendem o usuário como o “motor” do sistema, mas tendo como foco a prevenção e não a repressão, a Suécia é um exemplo deste tipo de posicionamento. O uso e posse de drogas na Suécia são criminalizados, contudo, a pena para tal crime passa por multas e integração em programas de tratamento, ou seja, não há a intenção de criminalizar o usuário apenas o uso de drogas.

            Segundo o Senador Gerson Camata seu projeto não pretende modificar o status legal atual que privilegia o serviço comunitário em detrimento da detenção, mas assegurar o rigor da medida punitiva conforme o que estabelece o código penal. Para LARANJEIRA (2010), nem a descriminalização nem a despenalização resultam em vantagens sociais, visto que ambas as medidas deixam intactas o submundo do tráfico e, por conseguinte suas relações, por outro lado, tais políticas também não provocam aumento do consumo.[2] Caberia então uma pergunta: quais das duas políticas são mais interessantes do ponto de vista do benefício social?
           
            Se o debate sobre a legalização ainda encontra uma resistência nos núcleos políticos, sobretudo, naqueles mais conservadores, a descriminalização já é vista com mais tolerância, por outro lado, as medidas repressivas já se demonstraram ineficazes do ponto de vista social. A despenalização, neste sentido, é percebida como um meio de reduzir os efeitos da criminalização, ou seja, mantém criminalizado o uso e porte para consumo pessoal, mas não se criminaliza o usuário/portador.

            Se a despenalização pode ser considerada como um avanço nas políticas sobre drogas no Brasil, os motivos para tal percepção podem ser explicados a dois fatores, um deles seria o entendimento de que a questão das drogas é uma questão de saúde pública e não uma questão puramente criminal. Outro fator pode ser explicado pela tentativa de reduzir a população carcerária no país. A despenalização surge como uma alternativa perspicaz, embora seus efeitos só sejam percebidos entre as classes mais privilegiadas, pois os usuários que vivem nos morros e nas ruas das periferias continuam sendo tratados como “marginais” e “desocupados”, são espancados quando flagrados portando ou consumindo drogas, são encarcerados por “delitos relacionados ao uso de drogas” e encontram-se desassistidos de proteção social. Falta ternura e brandura por parte do aparelho estatal, este trata a violência com violência, os resultados são os piores possíveis.



Jonatas C. de Carvalho é formado em história e é presidente do Conselho de Políticas Públicas Sobre Drogas em Cabo Frio.     


[1] Folha de São Paulo, 21 de Fevereiro de 2004.
[2]Laranjeira. R.  Ciência e Saúde Coletiva. Vol.15 nº3 Rio de Janeiro, Maio de 2010. 

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Desconstruindo estereótipos e reconhecendo demandas

     Precisamos repensar, com todo cuidado, a relação entre drogas, violência e juventude considerando a complexidade que se coloca nesta questão.Apenas drogas e violência já é um tema carregado de representações sociais que necessitam ser desconstruídas. Vocês sabiam que as pesquisas em psicologia social apontam que o estereótipo do antigo binômio pobreza = violência foi substituido no imaginário social pelo estereótipo drogas = violência ?

       
      Ainda temos um terceiro desafio que é a automática associação entre drogas e juventude e também entre violência e juventude. Com este discurso e por esta lógica simplista acabamos colocando uma marca negativa na juventude brasileira: basta ser jovem para ser ou drogado, ou violento ou ambos drogado e violento.
   
      Identificamos como especialmente tendenciosa e falsa a pergunta: - os jovens estão tão violentos porque se drogam? Ou (pior ainda) – se drogam porque querem ser violentos?           

      Neste momento histórico em que o Governo Federal dirige-se aos jovens, através da SENAD neste Mundo Jovem, a primeira palavra que dirigimos aos jovens brasileiros leitores desta página é de que acreditamos em sua força transformadora, em sua luta por um mundo melhor e pela construção de um Brasil cada vez mais brasileiro. Saibam que enquanto nos países do primeiro mundo a juventude é uma categoria dentre as minorias, no ano de 2007, no Brasil, a população de jovens será a mais numerosa e isto representa uma imensa força: a força jovem que representa o nosso grande capital e que, portanto, deve constituir o grande investimento de nossas politicas públicas. E é neste espírito que me dirijo em primeiro lugar aos jovens, mas também aos profissionais e, em especial, aos gestores das políticas publicas com este convite e apelo: vamos mudar esta mentalidade que associa juventude a drogas e violência e reconheçamos nos jovens o que este País tem de melhor!

      Neste contexto, sim, pensemos , e muito seriamente: Como ajudá-los a enfrentar todos os apelos e mesmo a imensa pressão existente na nossa sociedade para o consumo de drogas? Esta é a verdadeira questão: Como diminuir os apelos da cultura aditiva e da cultura de violência que caracterizam a sociedade atual?  Refiro-me, aqui, às tantas violências as quais os jovens estão expostos no seu percurso cotidiano: a violência da mídia que transmite informações enganosas e trazidas pelos seus próprios ídolos; a violência da falta de controle na compra das drogas lícitas; a violência do mercado de distribuição das drogas ilícitas que os recruta sutil e irremediavelmente para o mundo do tráfico- onde desnecessário dizer- a violência é a lógica e a cultura vigente.

      Penso que a primeira violência a ser combatida é a do discurso da juventude violenta e drogada que gera distanciamento dos jovens, impedindo que os conheçamos em sua natureza sonhadora  e que os comprendamos em suas expressões por mudanças.

      Em minha experiência como terapeuta de adolescentes e como pesquisadora na área, estou convencida que o jovem ao buscar as drogas tem uma demanda e esta não é de destruição nem de si mesmo e nem do outro ou da sociedade. Não acredito que a drogadição, mesmo em seu grau mais comprometido, seja um comportamento destrutivo. Reconheço no ato de drogar-se o valor de um ato que tem um sentido o qual precisa ser reconhecido e conhecido: em primeiro lugar pelo próprio usuário (seja ele jovem ou adulto), mas também por aqueles que o cercam. Quando nos debruçamos sob este prisma da compreensão e do valor deste sintoma como comunicação - geralmente bloqueada por outras vias - já fizemos a mudança necessária e passamos a estar de outra forma com o jovem: como um sujeito que nos demanda, que nos pede que nos fala de si e de nossa relação com ele.

      Compreender e atuar nesta área nos exige, antes de tudo, um crédito nos potenciais da juventude e um compromisso com eles na busca dos seus sonhos. Mas quais são os sonhos da juventude brasileira?

      Pensemos: será que esta anestesia com as drogas, em vez de uma busca pela violência ou de uma alienação face às dificuldades que enfrentam, não seria um grito de alerta para que os adultos reparem melhor nas suas necessidades e anseios? Pensemos diferente: consumir drogas não é uma doença; é, antes, um sintoma. Um sintoma é um sinal; é uma comunicação; seria como a febre que nos indica que algo não está bem. Neste sentido não é uma doença. Não é um problema mas é uma equivocada busca de solução . Neste sentido, buscar drogas seria uma espécie de febre da alma ou do coração ou da emoção.

      Se pensamos de forma diferente, percebemos diferente e podemos, então, agir de forma diferente: visualizamos, assim, uma postura mais clínica e compreensiva e a pergunta já é outra: - Do que sofrem os jovens que buscam as drogas? O que reivindicam? Quais denúncias expressam através deste ato? Por quais mudanças estão lutando? Para desafiar os próprios jovens leitores do Mundo Jovem, lanço a minha hipótese: os jovens denunciam a violência vivida em seu dia que pode ser em diferentes níveis e de naturezas diversas. Finalizo desafiando os leitores a prosseguirem nesta reflexão levantando suas próprias hipóteses sobre quais seriam as violências vividas que justificam a demandas dos jovens pelas drogas e sua relação com as tantas violências das quais são alvo, mas não são apenas vítimas pois que estão reagindo.

      Maria Fátima Olivier Sudbrack      Doutora em Psicologia ( Université de ParisXIII) e Pós-doutora em Psicossociologia ( Université de Paris VII)
      Professora Titular do Departamento de Psicologia Clinica/Instituto de Psicologia /Universidade de Brasília
      Pesquisadora do CNPq  
      Coordenadora do PRODEQUI- Programa de Estudos e Atenção às Dependências Químicas/PCL/IP/UnB
      Psicóloga clinica, terapeuta de familias e de adolescentes
Texto extraído de OBID- Observatório Brasileiro de Informações sobre Drogas - Mundo Jovem.